30 de abril de 2009

Os outros sobre nós


Questione-se o leitor sobre as poucas vezes em que os partidos se uniram em torno da aprovação de uma lei. Pode incluir na resposta a atribuição de louvores e de méritos. Pode excluir a legislação fundamental para o progresso do país desde a justiça à saúde, passando pela economia e pela educação. Na verdade os partidos têm a capacidade de gerar desentendimentos entre si, sobre a capa das diferenças ideológicas. Mas no que respeita à sua sobrevivência e aos interesses internos entendem-se com a mesma facilidade com que constroem argumentação estúpida para justificar o desrespeito pelos portugueses.

Hoje, na AR, todos os partidos se uniram na aprovação de uma nova lei de financiamento dos partidos que multiplica excessiva e vergonhosamente o valor da contribuição dos privados, sem necessidade de justificação, e mantém o valor da subvenção estatal. Tudo isto, ingenuamente claro, num ano em que se realizam três campanhas eleitorais e em que se acentuam as suspeitas e os casos de corrupção na sociedade portuguesa e tanto se fala do enriquecimento ilícito.

A nova lei não só é um retrocesso legislativo como é também um sinal grave dado à sociedade sobre os interesses e as prioridades de entendimento dos partidos. Tenho defendido, e reforço, que esta AR é das que têm contribuído mais para a diminuição da qualidade do debate político e para uma quebra de princípios e de valores de que a sociedade carece ter como referência.

Num acto de lucidez e de ensinamento político o deputado socialista António José Seguro teve a coragem de dizer o que os portugueses pensam e de se opor à aprovação da lei. Fê-lo com os argumentos certos, com a serenidade e a reflexão de quem percebe, embora a juventude que lhe acusam, os efeitos de uma lei desta natureza num momento conturbado como este. Felizmente AJS dá-nos a esperança de que uma nova geração ainda se preocupa com a salvaguarda dos valores e dos interesses colectivos de uma sociedade abandonada, e gozada, pela classe política actual!

22 de abril de 2009

O que Sócrates teve a coragem de dizer...


O primeiro-ministro criticou directa e duramente a TVI, em particular o Jornal Nacional de Sexta-feira, por considerar aquele programa de informação persecutório na detracção e no ataque pessoal de que se considera vítima. Analisadas as coisas com superficialidade é fácil acusar Sócrates de uma atitude sem precedentes e que pouco dignifica o seu mandato de estado. Mas se reflectirmos sobre as palavras e aprofundarmos a memória de um programa de informação cujo principal destaque está na pronúncia de opiniões e considerandos pessoais da jornalista entenderemos o que quis dizer o PM.

O que Sócrates teve a coragem de dizer é o que muitos políticos pensam, e empresários e outros portugueses que se esforçam para não assistir a tal programa. Porque o que é demais também cansa é importante que alguém tenha a coragem de dizer que neste país há um jornalismo bacoco e rude que se constitui como arauto dos bons costumes, mas que não é mais do que o abuso e a desconsideração pelos valores e pela ética.

O que Sócrates teve a coragem de dizer é perceptível por todos aqueles que se vestirem de bom senso e que sejam respeitadores das causas individuais e colectivas. Porque num estado de direito é importante valorizar e proteger a imprensa e a liberdade de quem escreve informação como profissão. Mas no mesmo estado de direito não podem estar em causa as liberdades e as garantias de cada cidadão em submissão do entendimento que um outro (por ser jornalista) que ostenta a subjectividade como se tratasse da mais impoluta avaliação de carácter.

O que Sócrates teve a coragem de dizer merece uma reflexão dos políticos e dos portugueses, não porque o PM é a vítima mas porque está em causa um crescente mau exercício do poder de informar. E se percebermos as palavras de Sócrates sabemos que não generalizou, que não incluiu nesse rol os jornalistas enquanto classe ou a comunicação social como sector, o que disse foi com total objectividade, com factos e argumentos que cheguem para que fosse um primeiro-ministro a dizê-lo.

Em resposta o Director-Geral da TVI, Eduardo Moniz, decidiu processar o PM. Embora a legitimidade da ofensa e do processo deveria o mesmo reconhecer a Sócrates o direito a se defender de um ataque massivo à sua honorabilidade nos últimos meses, como aqui referi.