29 de março de 2009

O proveito sobre o demérito


Considero a discussão sobre os prémios dos gestores um absurdo típico de uma sociedade habituada a valorizar o acessório em detrimento do essencial. E quando refiro a sociedade não desculpo os líderes de opinião que nos jornais e nas televisões e nos partidos viciam a argumentação séria e objectiva.

Na verdade nada me incomoda que os gestores sejam premiados pelo desempenho das suas funções, desde que esse desempenho se centre nos objectivos de mérito e de serviço cumprido. Tão pouco constitui preocupação o facto de gestores – públicos ou privados – serem reconhecidos pelo seu trabalho, o que normalmente se reflecte na vitalidade das empresas, na garantia dos postos de trabalho e no desenvolvimento da economia.

Ou seja, se um gestor conseguir cumprir os objectivos traçados pelos accionistas – e no caso das empresas do estado relembro que esses accionistas somos nós – e no seu cumprimento valorizar os activos e aumentar a produtividade e o lucro, então parece-me óbvio e sensato quer esse gestor seja premiado.

Mas o que parece ser a confusão e o aproveitamento para se tratarem todos como igual é o pagamento de prémios a maus gestores, aqueles que geram sucessivos prejuízos nas empresas que administram. E esse é evidente que não merecem prémios ou sequer a confiança dos seus accionistas, mas no caso dos privados esse é um problema que nos transcende, excepto no caso dos apoios estatais.

E no caso das empresas públicas – e existem muitos casos, infelizmente – a solução passa por contribuir com uma nova carreira na vida profissional de tais gestores. E isto é tão básico que me parece absurdo querer tratar todos como prevaricadores e incompetentes. Aliás este discurso, populista e radical, da esquerda caviar e da direita propagandística é um mau estímulo para que se regenerem os perfis dos gestores.

Agora, prejudicar os gestores que em circunstâncias difíceis e de crise foram capazes de gerar riqueza, promover investimento e manter postos de trabalho não é apenas “inveja social”, é também e sobretudo burrice, no mais elementar sentido da expressão. E com isto Portugal não tem nada a ganhar, pelo contrário estimula a saída de gestores para o estrangeiro, o que nos últimos anos tanto temos lamentado.

Por fim, a boleia que muitos quiseram aproveitar foi a dos casos americanos e da intervenção de Obama na repartição de prémios nas empresas intervencionadas. Outro erro de análise, que espelha o sentido reactivo e oportunista, porque no caso em concreto as intervenções existiram e a justiça actua, e aqui não. Como português fico contente e satisfeito com os lucros da PT e da EDP, e de tantas outras empresas, porque essa é missão do sector mais contributivo em Portugal!

26 de março de 2009

A falência dos critérios


A SIC tem dado notícia de uma eventual insolvência do Estado Português em 2014. Esta ideia, contabilizando os investimentos públicos e o seu pagamento nos próximos anos, tem passado como uma catástrofe que colocaria o país na banca rota e se hipotecariam as gerações futuras. Não pretendo discutir os procedimentos técnicos e científicos que basearam esta notícia, nem tão pouco levantar quaisquer suspeitas sobre as motivações e oportunismo da respectiva reportagem.

No entanto esta ideia é secundada por alguns economistas. E neste caso já percebo a preocupação. De facto nenhum deles soube, ou foi capaz, de prever a crise que vivemos. Nenhum deles questionou ou contradisse as medidas e as opções em investimento público que Manuela Ferreira Leite tomou enquanto Ministra de Estado e de Finanças de Durão Barroso, a recordar: o pagamento especial por conta; o TGV (!?); Auto-estradas; SCUTS; o aumento do IVA; o aumento do IRC; O Aeroporto da OTA (!?); etc. E nesta altura o défice andava acima dos 6%!...

E numa reacção imediata às declarações destes economistas é normal que se gere um pânico desmedido e uma alarmante preocupação no seio dos portugueses, e ainda, mas não menos grave nos investidores privados, os portugueses e os estrangeiros. E posto isto o que pareceria ser um exercício de puro academismo não mais é que uma falácia e um engodo demagógico em período eleitoral.

Se é verdade que o investimento público agrava a despesa do Estado também é verdadeiro que o mesmo estimula a economia, dinamiza as empresas, fomenta mais emprego, atrai mais investimento estrangeiro, aumenta as exportações, reforça a cobrança de impostos e diminui os custos sociais do Estado. É igualmente verdade que o que gastarmos hoje iremos pagar amanhã, mas esse é o custo da oportunidade, as opções que se devem sobrepor às indecisões. E neste caso, parafraseando o PM: “Já chega de descrever, é tempo de agir!”.

24 de março de 2009

Os pais deles

Foto: RTP1

Os estudantes do ensino secundário realizaram hoje uma manifestação em praticamente todo o país com o objectivo de contrariar as políticas introduzidas no sistema, mais concretamente com: o aumento do apoio social; a não privatização do ensino público; a eliminação das propinas; e a revisão do estatuto dos alunos. Feita a manifestação percebemos a fraca adesão, fruto de uma incapacidade de mobilizar, e o desacerto temporal desta reivindicação.

Em primeiro lugar é importante perceber que os alunos fizeram um aproveitamento da contestação social que incide sobre o governo, querendo, à boleia, fazer valer mais incómodo para a Ministra da Educação. Depois importa entender que nas reivindicações – cujas legitimidades e algumas razões lhes assistem – os alunos deixaram passar o tempo, ou melhor o tempo passou por eles, ficando reféns de factos consumados.

Num e noutro caso é fácil compreender que os alunos de hoje não são o porta-estandarte das lutas e das convicções ideológicas e de valores de outros tempos. E não o são por culpa própria e por elementos externos. Hoje muito se cultiva o individualismo, o salve-se quem puder, deixando-se cair os interesses colectivos e as lutas de gerações. A geração de hoje adormeceu no meio de vídeo jogos e chats, perdeu o tempo das coisas entre festivais e outras distracções que lhes retiraram a liberdade de pensamento na ligação à vida real. Dirão alguns que é o progresso da sociedade. Pois será, mas é um mau exemplo de progresso. Porque precisamos de uma juventude activa e critica, que seja interventiva e defensora de novos valores de convivência e de responsabilidade.

Mas a grande alteração na sociedade educativa e que condicionou e modificou a participação dos alunos na sua vida adolescente não é da sua responsabilidade directa: hoje os pais – através das associações de pais e confederações – substituiram os filhos, os alunos, na defesa dos seus direitos e até no eventual erro da sua actividade contestatária (essencial para se formarem como cidadãos). O que os pais estão a fazer é mais que substituírem os filhos: é serem proteccionistas dos mesmos, anulando-lhes a necessidade de formarem reflexões e tornando-se os pais, novamente, os agentes de um sistema de ensino que já não lhes pertence. E tão curioso ou irónico é o facto de serem estes pais os baluartes de uma geração contestatária que encheu ruas e fechou escolas, que enfrentou ministros e obrigou à rectificação de políticas e que são hoje os mais conservadores cidadãos e em muitos casos a anulação do valor dos próprios filhos.

18 de março de 2009

Prover soluções

É um facto que PS e PSD não se entendem quanto à nomeação de um Provedor de Justiça. É outro facto que Nascimento Rodrigues acumula o tempo de excesso numa função que já nada lhe diz e que se encontra no meio de um absurdo desentendimento partidário. E a isto não resiste o sistema democrático.

Não me parece importante apurar responsabilidades. A verdade é que a culpa se reparte numa ligeira interpretação dos cargos públicos, sobretudo aqueles em que está em causa o funcionamento das instituições. E nem o PS nem o PSD são capazes de perceber tal urgência e prioridade. Desde que a cada um se satisfaça um ego de poder e de prestigio. Enquanto isso a credibilidade da democracia descai aos olhos dos cidadãos.

E aos cidadãos é-lhes passada uma imagem de controlo sobre quem os protege! Aos cidadãos, num estado em que a justiça é morosa e nem sempre eficaz, é dado a entender que antes dos seus interesses existem outros que importam salvaguardar. E num mandato tão activo, é oportuna uma intervenção do Presidente da República: não para vetar nomes, mas para fazer um ponto de ordem à mesa e retomar – como lhe compete – o melhor funcionamento das instituições!


15 de março de 2009

Opções de governabilidade


Para José Sócrates as manifestações e a contestação social que saem à rua são manipulação do PCP, através da CGTP. Para Jerónimo de Sousa o Primeiro-ministro está enganado na análise e distante de uma realidade nacional bem mais grave. Mas, vistas as coisas, ambos têm razão: é o PCP quem lidera as manifestações sociais, usando o movimento sindical, a exemplo de uma prática mais acutilante e conservadora a que o actual líder não é alheio. Mas também Sócrates ignora, ou finge ignorar, uma realidade séria de dificuldades e constrangimentos com que os portugueses – na sua maioria – se deparam.

E num e noutro argumento existe um aproveitamento típico das lutas políticas: nem a contestação social sindical respeita à imagem o país real, nem o PM dá sinais de um combate férreo para minorar as dificuldades. Porque no primeiro caso o PCP usa o mediatismo como arma para ferir ainda mais a imagem do governo, e tão só com esse objectivo, capitalizando os votos descontentes que tradicionalmente acolhe; e ainda porque no segundo caso o governo responde aos ataques numa defesa proporcional descurando as frentes reais.

Não tenho dúvidas de que o exercício deste governo é entre o razoável e o bom, longe de ser muito bom embora outro partido também não o pudesse atingir, e nesta avaliação o resultado é positivo! Podem-se referir as conjunturas que o marcaram nos primeiros dois anos e as outras que o agravaram nestes últimos dois. Podem-se desculpar um ou outro erro, de casting ou de política, alguns recuos ou excessivos avanços, mas o governo tem dado sinais de estabilidade e de determinação, o que para a confiança nacional é de maior importância. Já ouvir o SG do PCP afirmar que está disponível para governar caso os eleitores o queiram, para além de ser uma constatação demasiado óbvia, cria algum desconforto na estrutura de segurança dos portugueses.

Tenho dito e escrito, repetidas vezes, que um dos factores essenciais para o crescimento do país é a constituição de uma oposição forte e credível. E a verdade é que essa alternativa não existe. E o PCP, tal como o BE e o CDS, perceberam o desmoronamento da bipolarização, e trazem para a rua a contestação que sabem ser mais eficaz do que os lautos discursos. Mas que é insuficiente para construir alternativa.
Mas a alternativa persiste em não acontecer, porque o gigante adormecido - leia-se PSD - ainda não encontrou o seu rumo no meio disto tudo. Por uma ou por outra razão importa perceber, que não sendo este um governo perfeito, ou com resultados excepcionais, o que se percebe não ser fácil nas actuais circunstâncias, a oposição está longe de poder assumir a governabilidade do país. E isto não é mero exercício de chantagem política, é uma contestação de facto, a que a manipulação sindical do PCP não é alheia, nem tão pouco a acção governativa. Em política raramente as coisas acontecem por acaso…

7 de março de 2009

O efeito espelho de Manuel Alegre

Foto: RTP


Em entrevista ao Expresso, o Deputado e militante do Partido Socialista Manuel Alegre afirmou que caso a lei o permitisse promoveria uma candidatura independente contra o PS, nas legislativas! Uma semana depois da sua ausência no Congresso, uma semana depois de ter aceite fazer parte da Comissão de Honra do Congresso, uma semana depois de ter recusado integrar os órgãos nacionais do partido a convite de José Sócrates, o deputado que se afirma da génese do combate ao fascismo e da luta pela liberdade, vem dar uma vez mais uma machadada na sua militância e no partido que lhe deve muito mas que também é credor da figura em que Alegre se constituiu.

Com esta atitude, e somando todas as outras, está mais que provado que Manuel Alegre não é apenas um resistente das causas – o que aliás já referi várias vezes não são preocupações do mesmo – mas também, e sobretudo, um corredor solitário, com agenda própria e um ego por alimentar maior que o do próprio PS e da esquerda portuguesa. O que Alegre quer é um país atento aos seus ditos, à inoportuna divisão que promove, como se fosse um salvador da pátria de que a pátria não carece. O que Manuel Alegre está a construir é um fosso entre a sua figura e a sociedade que se cansa dos seus métodos e dos calculismos com que define um percurso político.
Também eu sou, em muitas matérias, divergente da opinião do PS. E também eu não me coíbo de argumentar pelas minhas convicções, mas jamais o farei à custa de um projecto democrático essencial para Portugal, como é o Partido Socialista. Também, numa ou noutra ocasião, alguns confundiram as minhas criticas com a oportunidade de me virar contra o PS, mas enganaram-se porque não confundo o PS com os caminhos ocasionais que percorre. E Manuel Alegre vive para além de uma liberdade de opinião, que o PS acolhe e respeita. Vive, sobretudo, e atrevo a escrever exclusivamente, para si numa relação fechada como se entre si e o país apenas existisse um espelho de vaidades. E o caminho que segue, o que escolhe nas suas palavras e nas suas acções, deveria fazê-lo reflectir sobre o porquê da sua permanência no PS! Porque se está mal pode sempre sair, e porque se considera tão imprescindível pode sempre constituir-se como alternativa democrática. Agora, o que Alegre não pode fazer é usar o PS para ter voz pelo simples facto de estar em precisos desacordos.

1 de março de 2009

Vitalidade e Consequência

Foto: Daqui


A escolha de Vital Moreira para encabeçar a lista do PS às eleições europeias é uma surpresa positiva que Sócrates guardou para anunciar no Congresso nacional. Mas mais que surpreendente é a importante decisão do académico na aceitação desta missão: porque se trata de alguém cuja respeitabilidade é inquestionável, cujo percurso profissional é notável e que carrega consigo um pensamento construtivo e amplo sobre as diversas questões. Não seria previsível que Vital Moreira aceitasse tal desafio, mas aceitou-o com argumentos e objectivos concretos, tal qual se esperaria de uma figura tão destacada da democracia portuguesa.

Mas desta candidatura tiram-se outras elações como o facto de demonstrar a vitalidade do PS e a sua capacidade de mobilizar a sociedade civil, sobretudo num momento em que se questionava essa capacidade de recrutar para o seu projecto político cidadãos com a dimensão e a credibilidade moral e ética de Vital Moreira. E este não é um ponto de somenos importância, pelo contrário, traz à imagem de Sócrates e do PS um voto de confiança de uma sociedade civil que se revê nas políticas e na acção dos socialistas. Este recrutamento, e agora se percebe que mais existirão nos próximos tempos, reflecte a abrangência do PS e a cumplicidade que gera na sociedade através do seu projecto.

Seria um sinal de fragilidade – o que é um traço comum aos partidos no governo – que a sua capacidade de desafiar figuras de mérito fosse negada pelos próprios: a isto se chama a descredibilização dos projectos políticos. Mas não é este o caso, pelo contrário.

Outro dado relevante desta candidatura é o facto de a mesma reflectir sobre a importância do acto eleitoral em questão e sobre a fundamental participação de Portugal no Parlamento Europeu. E fazê-lo com um critério de abrangência, com uma figura da dimensão de Vital Moreira, deixando de lado as conveniências partidárias e os compromissos internos, é uma marca que Sócrates deixa quanto à importância que atribui ao exercício da vida política. E convenhamos, nos tempos presentes é algo elogiável.

Do ponto de vista eleitoral é evidente que se trata de uma grande escolha, pela abrangência, principalmente em toda a esquerda, pelo nível de debate que impõe e sobretudo pelo rombo que provoca no interior do PSD, cujo putativo candidato será sempre refém desta candidatura. Mas o importante é que o debate se faça e que se faça com o sentido de credibilidade política que Sócrates e Moreira anunciaram.